Hora de tirar vantagem da crise
Vinho nacional comemora a desvalorização do real
Crise é sempre ruim, mas esta pode proporcionar alívio a um setor que vem sendo sufocado nos últimos anos pelo bom desempenho da economia brasileira: o da vitivinicultura. A boa evolução da economia nos últimos anos trouxe um grande volume de dólares para dentro do país, provocando a valorização do real e permitindo a elevação das importações.
Em 2002, quando a moeda norte-americana atingiu R$ 3,80, o vinho importado representava 48,8% do mercado brasileiro. Neste ano, a média de janeiro a agosto indica que os importados representam 76,8% do mercado. No início de agosto, o dólar estava a R$ 1,56.
No ano passado, quando o dólar terminou o ano a R$ 1,77, entraram 57,6 milhões de litros de vinho no país. Mantido o ritmo de importações de 2007, o volume deste ano poderia atingir 70 milhões de litros.
A concorrência ficou mortal para o produto brasileiro. Há registros de importações de vinho a US$ 4,35 por caixa de 12 garrafas, ou seja, US$ 0,36 por unidade (R$ 0,57). Esse valor não paga o custo da garrafa vazia, dizem produtores nacionais. Além disso, outros 15 milhões de garrafas entram no país via contrabando, segundo informações do setor.
Embora o retorno do dólar a patamares superiores a R$ 2 traga alívio e iniba as importações, a viticultura não deixa de ficar apreensiva com a crise, que pode afetar a renda dos consumidores. Afinal, o vinho seria um dos produtos a sair da lista de consumo com a queda da renda familiar.
Além de ajudar as vendas nacionais, a elevação do dólar deve facilitar as exportações brasileiras, tornando o produto mais competitivo. Grande parte das empresas brasileiras já faz exportações rotineiras.
"É uma questão cambial e conjuntural", diz Márcio Bonilha, diretor nacional de vendas da Miolo Wine Group. Assim como os importadores foram beneficiados com a queda do dólar, agora é a vez de os nacionais se beneficiarem, acrescenta Bonilha.
Mas essa questão cambial vivida pela indústria do vinho é apenas uma parte do problema. Estudos do setor mostram que o vinho nacional chega à gôndola dos supermercados com carga tributária elevada.
Para Hermes Zanetti, presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Viticultura, Vinhos e Derivados, "seguramente a alta do dólar vai ajudar a frear a inundação do mercado brasileiro por vinhos importados, principalmente os mais baratos".
Atualmente, de cada quatro garrafas de vinho fino vendidas, três vêm de fora. Já o consumo de espumantes mostra exatamente o contrário, com apenas uma importada em cada quatro consumidas.
O excesso de importações de vinho nos últimos anos elevou os estoques nacionais e já complica a recepção de uvas pelas indústrias na próxima safra, diz Zanetti. Se acentuada, essa crise vai ser repassada para 20 mil famílias que cultivam uma média de 2,5 hectares.
O setor certamente terá um alívio com a desvalorização do real, "mas a gangorra do dólar não explica tudo", diz Alem Guerra, diretor comercial da Vinícola Aurora. Além da concorrência do dólar barato, o setor teve um constante aumento de custos, vindo de energia elétrica, encargos sociais e insumos específicos.
Fonte : Folha de São Paulo
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